Da
Homilia na Dedicação da Basílica Nacional de Aparecida, do papa João Paulo II
A devoção a Maria é fonte de vida cristã profunda
“Viva
a Mãe de Deus e nossa, sem pecado concebida! Viva a Virgem Imaculada, a Senhora
Aparecida!”
Desde que
pus os pés em terra brasileira, nos vários pontos por onde passei, ouvi este
cântico. Ele é, na ingenuidade e singeleza de suas palavras, um grito da alma,
uma saudação, uma invocação cheia de filial devoção e confiança para com aquela
que, sendo verdadeira Mãe de Deus, nos foi dada por seu Filho Jesus no momento
extremo da sua vida para ser nossa Mãe.
Sim,
amados irmãos e filhos, Maria, a Mãe de Deus, é modelo para a Igreja, é Mãe
para os remidos. Por sua adesão pronta e incondicional à vontade divina que lhe
foi revelada, torna-se Mãe do Redentor, com uma participação íntima e toda
especial na história da salvação. Pelos méritos de seu Filho, é Imaculada em
sua Conceição, concebida sem a mancha original, preservada do pecado e cheia de
graça.
Ao
confessar-se serva do Senhor
(Lc 1,38) e ao pronunciar o seu sim, acolhendo “em seu coração e em seu seio” o
mistério de Cristo Redentor, Maria não foi instrumento meramente passivo nas
mãos de Deus, mas cooperou na salvação dos homens com fé livre e inteira obediência.
Sem nada tirar ou diminuir e nada acrescentar à ação daquele que é o único Mediador
entre Deus e os homens, Jesus Cristo, Maria nos aponta as vias da salvação,
vias que convergem todas para Cristo, seu Filho, e para a sua obra redentora.
Maria nos
leva a Cristo, como afirma com precisão o Concílio Vaticano II: “A função
maternal de Maria, em relação aos homens, de modo algum ofusca ou diminui esta
única mediação de Cristo; antes, manifesta a sua eficácia. E de nenhum modo
impede o contato imediato dos fiéis com Cristo, antes o favorece”.
Mãe da
Igreja, a Virgem Santíssima tem uma presença singular na vida e na ação desta
mesma Igreja. Por isso mesmo, a Igreja tem os olhos sempre voltados para aquela
que, permanecendo virgem, gerou, por obra do Espírito Santo, o Verbo feito
carne. Qual é a missão da Igreja senão a de fazer nascer o Cristo no coração
dos fiéis, pela ação do mesmo Espírito Santo, através da evangelização? Assim,
a “Estrela da Evangelização”, como a chamou o meu Predecessor Paulo VI, aponta
e ilumina os caminhos do anúncio do Evangelho. Este anúncio de Cristo Redentor,
de sua mensagem de salvação, não pode ser reduzido a um mero projeto humano de
bem-estar e felicidade temporal. Tem certamente incidências na história humana
coletiva e individual, mas é fundamentalmente um anúncio de libertação do
pecado para a comunhão com Deus, em Jesus Cristo. De resto, esta comunhão com
Deus não prescinde de uma comunhão dos homens uns com os outros, pois os que se
convertem a Cristo, autor da salvação e princípio de unidade, são chamados a
congregar-se em Igreja, sacramento visível desta unidade humana salvífica.
Por tudo
isto, nós todos, os que formamos a geração hodierna dos discípulos de Cristo,
com total aderência à tradição antiga e com pleno respeito e amor pelos membros
de todas as comunidades cristãs, desejamos unir-nos a Maria, impelidos por uma
profunda necessidade da fé, da esperança e da caridade. Discípulos de Jesus
Cristo neste momento crucial da história humana, em plena adesão à ininterrupta
Tradição e ao sentimento constante da Igreja, impelidos por um íntimo
imperativo de fé, esperança e caridade, nós desejamos unir-nos a Maria. E queremos
fazê-lo através das expressões da piedade mariana da Igreja de todos os tempos.
A devoção
a Maria é fonte de vida cristã profunda, é fonte de compromisso com Deus e com
os irmãos. Permanecei na escola de Maria, escutai a sua voz,segui os seus
exemplos. Como ouvimos no Evangelho, ela nos orienta para Jesus: Fazei o que ele vos disser (Jo 2,5). E,
como outrora em Caná da Galiléia, encaminha ao Filho as dificuldades dos
homens, obtendo dele as graças desejadas. Rezemos com Maria e por Maria: ela é
sempre a “Mãe de Deus e nossa”.