ZENIT - O mundo visto de Roma

08/05/2010

A DANÇA


Ela chegou de mansinho e deslizou a mão pela minha nuca... Não liguei; podia ter sido engano meu; às vezes a gente se pega imaginando coisas. Mas o carinho se repetiu e eu já não podia me fazer de indiferente; da nuca seus dedos deslizaram zuavemente, como que brincando até a minha garganta e deram um toque bem no pomo de Adão, como aqueles que a gente dá com os dedos indicador e polegar quando quer testar a sonoridade de um objeto... "tchk": rrrrrrmmmm! Foi a resposta, como um eco.
Percebi que minhas pálpebras se apertaram e meu naiz se contraiu, como se querendo identificá-la pelo cheiro... mas se fosse ela ainda nao tinha usado seu perfume que mais gosto:é um aroma que aparenta morango azedo, bem químico: eritromicina... "Na dúvida, fique quieto... deixe-a se declarar; não pague mico!". Mas meu corpo já se aqueceu só de eu pensar nas possibilidades.
Tem coisas que a gente é o último a saber, ou melhor, a ter certeza... Pois não faltaram advertências... "É ela, é ela!" Então resolvi fazer uma armadilha para capturá-la: deitei-me sem camisa no sofá e fechei os olhos para não intimidá-la.
Aguardei.
Minha cabeça, meio zonza, idicava que ela estava ali.
Então ela tocou minha barriga. Foi um toque rápido, mas aqueceu... e depois deu outros toques subindo pelo meu peito, de forma reticente... e como uma pedra lançada horizontalmente sobre a água, que vai tocando aqui e ali e provocando perturbações na superfície até mergulhar de vez depois do seu percurso parabólico... A cada toque mais firme uma onda de calor era liberada e se alteranava com um friozinho que inversamente saltitava por dentro. O ponto final da sua mão inquieta e quente foi novamente a minha garganta... Ela conhece meu ponto fraco!
Aí tive certeza!
Demorei a acreditar porque não sou muito bom nesses tipos de relacionamentos e raramente me aventuro. Normalmente, quando vejo que ela me espera à frente, fujo pela janela e vou adiando nosso quase inevitável encontro... Mas em princípio gostei: o jogo de calor e frio acariciando minha pele mexeu com minha sensibilidade e só então percebi que meu corpo formigava e que mesmo o toque nos objetos provocava um estremecimento interior como se uma pequena descarga elétrica partisse da superfície e ecoasse nos ossos, subindo pela coluna e aquecendo e contraindo os músculos da fronte.
De repente sistema de autodefesa gritou: - "deixe de ser fácil! já vai assim se entregando? Que graça tem uma relação passiva dessa?" E mandou do cérebro à boca a primeira proposta de resistência aromática: Citrus Limon, Zingiber officinale Roscoe e Paracetamol. Sugeriu ainda, como era minha primeira vez, que fizéssemos um acordo, tipo assim: "use mas não abuse". Mandei bala. E ela recuou. Isso me causou uma grande satisfação. Mas eu, inebriado, não queria que ela fosse embora de vez: então usei apenas 15 gotas da poção. E começamos um jogo de ataque e defesa, nem tão forte e nem tão fraco, para que a brincadeira durasse mais um pouco...


Seguidores