Abaixo trecho de entrevista concedida pelo Cardeal Ratzinger – hoje Papa Bento XVI – ao jornalista Peter Seewald.
Talvez realmente já não seja possível
curar a partir do exterior, mas unicamente a partir do interior, curar
uma consciência que não é egoísta. O senhor acabou de referir que os
avisos bíblicos do mau estilo de vida talvez nos quisessem dizer: é a
nossa condição espiritual que influencia a natureza.
Sim,
parece-me claro que, de fato, é o Homem que ameaça retirar o sopro
vital à natureza. E que a poluição do ambiente exterior que observamos é
o espelho e o resultado da poluição do ambiente interior, à qual não
prestamos suficiente atenção. Julgo que é também o que falta aos
movimentos ecológicos. Combatem com uma paixão compreensível e
justificada a poluição do ambiente; a poluição espiritual que o Homem
faz a si mesmo continua, pelo contrário, a ser tratada como um dos seus
direitos de liberdade. Há aqui uma desigualdade. Queremos afastar a
poluição mensurável, mas não tomamos em consideração a poluição
espiritual do Homem e a figura da criação que nele se encontra, para que
se possa respirar humanamente. Defendemos, pelo contrário, tudo o que a
arbitrariedade humana produz, com base num conceito completamente falso
de liberdade.
Enquanto mantivermos essa caricatura de
liberdade, quer dizer, a liberdade de uma destruição espiritual
interior, continuarão imperturbavelmente os seus efeitos exteriores.
Julgo que devemos refletir sobre isso. Não é apenas a natureza que tem
as suas regras e as suas formas de vida, que temos de respeitar, se
quisermos viver dela e nela, mas também o Homem é interiormente uma
criatura e está sujeito à ordem da criação. Não pode fazer de si mesmo
tudo o que quer, como lhe apetece. Para que o Homem possa viver a partir
do interior, tem de aprender a reconhecer-se como criatura e tem de se
dar conta de que nela deve existir, por assim dizer, a pureza interior
devida ao fato de ele ser criatura, a ecologia espiritual. Se esse
elemento fundamental da ecologia não for compreendido, tudo mais se
desenvolverá num sentido negativo.
A epístola aos Romanos diz isso muito
claramente no oitavo capítulo. Diz que Adão, ou seja, o Homem
interiormente poluído, trata a criação como um escravo, a espezinha; a
criação geme sob ele, por causa dele, através dele. E hoje ouvimos o
gemido da criação, como nunca antes a tínhamos ouvido gemer. São Paulo
acrescenta que a criação espera a vinda dos filhos de Deus e que
respirará de alívio quando surgirem pessoas nas quais transpareça a luz
de Deus – e só então a criação poderá voltar a respirar.
[Cardeal Joseph Ratzinger, O Sal da Terra, capítulo III, A Catarse – A mudança de era e as suas dilacerações; pp. 183-184, Editora Imago, 2ª edição, Rio de Janeiro, 2005]
Fonte: Ecclesia Una
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